Na cultura a luta cresce,<br>e não é por artes mágicas

Jorge Feliiciano

Nos últimos anos, a luta em defesa da cultura, pelo direito de todos à criação e à fruição cultural, pela criação de um Serviço Público de Cultura em conformidade com este princípio constitucional, tem avançado e alcançado uma importante expressão de massas.

Não é alheio a este facto os esforços desenvolvidos por dezenas de activistas do Manifesto em Defesa da Cultura, o movimento unitário da luta organizada e persistente pelos direitos culturais onde participam também, com grande relevo, os comunistas.

A comprovar este avanço temos o exemplo bastante próximo de «Os dias da cultura em luta» dinamizados pelo Manifesto em Defesa da Cultura nesta primeira quinzena de Junho aos quais aderiram, subscrevendo um comunicado conjunto a exigir uma política alternativa para a cultura, 63 organizações representativas: sindicais, das artes, do património, da arqueologia, dos arquivos e bibliotecas, comissões de trabalhadores, do movimento associativo e popular, etc. Acto contínuo, no momento em que escrevemos, só nas acções ocorridas nos dias 9 e 13 de Junho em Lisboa, Funchal, Coimbra e Almada participaram pelo menos dois milhares de artistas e técnicos, profissionais e amadores, trabalhadores de serviços públicos da cultura centrais e municipais, dirigentes associativos e sindicais, entre muitos outros.

Não há memória, em tempos recentes, de uma unidade tão ampla e representativa em torno da defesa dos direitos culturais, unidos pela exigência de «outra política para a cultura».

Esta realidade demonstra que são cada vez mais aqueles que têm encontrado no Manifesto em Defesa da Cultura um espaço da defesa da cultura no seu todo, tanto enquanto sector de trabalho, tanto como vertente central de uma democracia que queremos avançada, onde o direito ao acesso de todos à criação e fruição cultural, a estruturação de um Serviço Público de Cultura dotado financeiramente de 1% do PIB (cerca de 2,5% do Orçamento do Estado), e o trabalho com direitos na cultura são eixos essenciais.

Com toda a confiança

Estas reivindicações, a sua justeza e clareza, transformaram-se já numa força material apropriada por muitos dos verdadeiramente empenhados e interessados em derrotar a política de direita e suas consequências antidemocráticas também no plano dos direitos culturais dos trabalhadores e do povo.

Não obstante o muito trabalho que há a fazer para conseguir transformar todo o potencial desta importantíssima frente de luta em realidade concreta, não podemos deixar de valorizar entusiasticamente o vasto terreno conquistado, batalha a batalha, consciência a consciência, tanto na rua como nos espaços de trabalho, da vivência e da experiência cultural.

Porque também na cultura a luta não se desenvolve por artes mágicas: implica organização, justeza nas orientações e muitos esforços aliados para levar a cabo todas as pequenas tarefas do dia-a-dia que alicerçam a solidez da sua progressão.

É esse o caminho a fazer para continuar a vencer resistências e progredir, pondo de parte as visões que tendam para a luta das influências de gabinete, dos corredores do poder, dos particulares privilégios, visões que pretendem que na cultura a luta se faça de forma higienizada, sem gritos nem clareza, e sem chamar os bois pelos nomes.

Importa também não deixar cair o entusiasmo perante visões derrotistas daqueles que sempre dizem, seja de uma acção com 30 ou outra com mil participantes, que é «sempre pouco», «que deviam estar mais» e que «isto assim não vai lá», desvalorizando desta forma todos os esforços feitos e fazendo por vezes crer que existirá uma qualquer forma mágica de mobilizar e alterar a correlação de forças sem ser necessário dar o corpo ao manifesto.

A luta concreta em defesa da cultura, como em todas as lutas dos trabalhadores e do povo português, tem demonstrado o inverso: tem demonstrado que é possível avançar, vencer dificuldades, ampliar e reforçar a frente de luta; tem demonstrado que as condições de alterar a presente realidade de exploração e empobrecimento estão hoje mais sólidas do que ontem; tem demonstrado que são cada vez mais aqueles que se unem para derrotar este Governo e a política de direita.

Não há oportunismos nem derrotismos que minimizem a importância do caminho percorrido, um caminho que nos enche de confiança, força e firmeza para a luta que continua!




Mais artigos de: Argumentos

Dos presidenciais alívios<br>e outras estórias

Vimos na televisão que o senhor Presidente Cavaco foi em visita oficial à Bulgária poucos dias depois de na cidade de Lamego ter falado ao País e cumprido a tarefa de distribuir condecorações a quem, naturalmente, as merece. Permita-se que se registe, de passagem, que esta...

Não esquecer Luuanda<br>de Luandino Vieira

Há cerca de 50 anos, um júri da Sociedade Portuguesa de Escritores, constituído por Alexandre Pinheiro Torres, Augusto Abelaira, Fernanda Botelho e Manuel da Fonseca atribuiu por unanimidade o grande prémio de novelística ao livro do escritor angolano Luandino Vieira, Luuanda. Na...